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  • Luciana Borges: no comando das demandas do onshore e de águas rasas

    Nova presidente da Abpip avalia o cenário atual e as perspectivas futuras para pequenos e médios produtores no Brasil

    Recém-eleita para comandar a Abpip (Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo) no período 2021-2023, Luciana de Miranda Martins Borges tem uma pauta extensa pela frente. Em entrevista ao PetróleoHoje, a nova presidente da entidade, que responde também pelo cargo de gerente-geral da Maha Energy, fala sobre os desafios da sua gestão, o mercado pós desinvestimentos da Petrobras, transição energética e outros temas do onshore e de águas rasas.

    Qual a sua avaliação acerca do papel da Abpip no cenário atual?

    A Abpip é uma associação que possui uma característica bem peculiar de proximidade. No ano passado, a entidade promoveu uma grande reestruturação interna. Foram criados comitês, separados por demandas e por tema, para dar maior celeridade às questões que precisam ser tratadas. Também fizemos um movimento voltado para o offshore, mais especificamente aos campo de águas rasas. Nos programas Reate e Promar, temos colocado muitas contribuições. As demandas, discussões e propostas são inúmeras. Todas elas buscam aprimorar o desenvolvimento da indústria onshore e offshore.

    Quais serão as prioridades do seu mandato? A intenção é dar continuidade aos trabalhos já realizados, imprimir uma nova marca ou fazer um pouco de cada?

    A proposta é fazer um pouco dos dois. Vamos continuar acompanhando a agenda regulatória, que é extensa e vasta, buscando aumentar o número de empresas associadas. Também vamos manter participação ativa no Reate e nas mesas de discussão, bem como no Promar. A ideia é que a gente mantenha a mesma estrutura de resposta e de abertura que temos para o Reate no Promar, buscando levar contribuição para sua agenda.

    A intenção é ser tão ativo no offshore quanto no onshore?

    Sim, a ideia é ser ativo nos dois, com foco nos aspectos regulatório, legal e comercial.

    Como avalia o papel da Abpip após o programa de desinvestimento da Petrobras?

    Queremos ser um ponto focal de convergência acerca das questões críticas que irão se desdobrar após a conclusão do programa de desinvestimento da Petrobras. Estamos cientes de que existem questões comerciais e regulatórias que precisam ser ajustadas para seguirmos em frente. Estou falando, por exemplo, de questões relacionadas ao acesso à infraestrutura e comercialização.

    Quantos associados a Abpip possui? Ainda: quantos são oriundos do offshore?

    Atualmente, temos 30 associados, sendo três empresas offshore (PetroRio, Perenco e BW Offshore).

    Ainda há uma boa perspectiva de ingresso para novas empresas que atuam em águas rasas…

    Tem sim. Acredito que haverá um aumento expressivo do mercado, que será impulsionado pelo desinvestimento da Petrobras, pela oferta permanente, pelos programas de revitalização e incentivo. Esperamos um movimento de crescimento e pulverização também, com mais empresas participando de um ambiente que antes era limitado à Petrobras. Essa pulverização é boa porque traz mais discussão, mais associados, mais ideias. Sempre melhora o mercado. Quanto mais aberto, mais sustentável ele é.

    Como vê a evolução efetiva dos principais pontos de discussão dos pequenos e médios produtores?
    Não há mais debate do que soluções práticas?

    É verdade. Acho que o momento atual é um divisor de águas para colocar a discussão em prática. Estamos chegando num ponto onde se não tivermos ação, não vamos caminhar naquilo que se espera. A ANP está muito mais engajada, as discussões são muitas mais efetivas, pois há uma compreensão de que a janela de oportunidades para o petróleo estreitou. Há, portanto, uma celeridade maior dos agentes. Apesar de ainda não estar em ação, as questões estão em pauta. Um exemplo é a questão dos royalties.

    Como a Abpip vê o setor após a conclusão dos desinvestimentos da Petrobras? É dado como certo uma nova frente de revisão de portfólio dos novos entrantes, com uma segunda onda de venda de ativos para empresas ainda menores?

    Sobre a segunda onda de desinvestimento de ativos, tenho exatamente a mesma percepção que você. Acredito que haverá um segundo movimento de desinvestimento, onde as empresas que adquiriram grandes polos farão exatamente o que a Petrobras fez, que é olhar para o seu core e eficiência. Aqui estamos falando de polos muito, muito extensos. E daí virá a possibilidade de uma abertura maior. O que estamos assistindo é a troca de uma operadora por duas ou três empresas. Essa segunda leva vai dar um movimento de pulverização mesmo, que é o que a gente espera que aconteça, que é onde teremos um ambiente onshore bem estruturado, com pequenas, médias e até
    grandes empresas lidando dentro do mesmo ambiente.

    Quais serão as demandas e entraves do pós-desinvestimentos?

    Toda a estrutura da Petrobras foi baseada na verticalização. Então, questões como acesso à infraestrutura, precificação e comercialização do óleo estão em primeiro plano. Teremos um mercado aberto, bem amplo, com mais opções do que temos hoje, mas que passará por uma fase intermediária de ajustes necessários. Diante de tal cenário, a Abpip terá um papel fundamental para promover um entendimento que passe pelas questões regulatórias, legais e comerciais.

    Essa discussão está sendo feita entre os novos compradores ou em conjunto com a Petrobras?

    Alguns desses temas a gente já começou a discutir, inclusive com a própria Petrobras, tornando essa discussão bem aberta e válida para entender também o que pode vir de proposta, de estruturação de sistemática que possa fazer sentido para um futuro sem a Petrobras, já que a petroleira afirma que quer realizar essa passagem sem traumas

    Ou seja, embora muitos temas ainda sejam antigos, o debate do onshore está apenas começando, diante dos desdobramentos e da abertura?

    São discussões bem diferentes do que se havia antes. Afinal, o mercado será completamente
    diferente.

    É provável que possa haver demandas diferenciadas, principalmente pela existência de um número maior de empresas de menor porte?

    Em certa medida, isso já acontece. Existem empresas, por exemplo, que não possuem capacidade financeira para avançar sobre os desinvestimentos da Petrobras, mas que estão atentas às possibilidades de aquisições menores ou oferta permanente, com visão de crescimento no país. As empresas pequenas independentes estão olhando para o segmento onshore do Brasil dizendo: “opa, deixa eu estar aqui pra já garantir o meu lugar por isso aqui vai ser algo bem diferente do que se tem até então”.

    A Abpip acredita na possibilidade de exploração dos recursos não convencionais no curto e médio prazos?

    Tem uma discussão grande. Existe um programa de poço piloto não convencional colocado pelo Ministério de Minas e Energia, que está em andamento e tem muito estudo a ser feito. Trabalhei na Gran Tierra e, durante muito tempo, toda a estratégia da empresa era centrada no não convencional. Fizemos muitos estudos na época e vimos muita coisa diferenciada. Acredito que é embrionário ainda. É necessário realmente que se façam estudos mesmo da viabilidade econômica. A viabilidade econômica do não-convencional precisa, obrigatoriamente, de volume. O não-convencional sem volume não existe, principalmente para o Brasil, porque ele não é barato. É barato nos EUA. Sem muito volume aqui, fica inviável. Tem muito estudo para acontecer. Sem a questão ambiental resolvida, não há de fato o que fazer, mas mesmo que destrave a questão ambiental, acredito que serão necessários muitos estudos geológicos em função da economicidade do não-convencional para as nossas bacias.

    As empresas do segmento onshore sentiram muito o peso da crise do preço do petróleo e da pandemia. Passado mais de um ano, como a Abpip enxerga o fôlego das companhias hoje?

    Acho que é, de fato, um novo momento. A pandemia veio e afetou muito a indústria do petróleo. O preço do brent na faixa de US$ 20-US$ 25 inviabiliza um percentual expressivo dos portfólios de todas as empresas, seja pequena, média ou grande. Acredito que o momento atual é de melhora, de ascensão e de mais esperança de que estamos chegando ao fim de toda essa pandemia e tudo de ruim que ela trouxe. Diante da cotação atual do brent no patamar de US$ 75 por e pelos próprios forecast de preços de petróleo, vê-se que as coisas estão andando para frente. Já vemos especialistas especulando sobre a possibilidade de US$ 100/barril novamente. Então, isso traz fôlego, renova a disposição das empresas que deixaram muitos projetos parados por questão de economicidade. Acredito que veremos um bom crescimento, com projetos indo pra frente. Tenho uma percepção bem positiva para um muito bom 2022.

    Como a Abpip enxerga a questão da transição energética e o debate em torno da descarbonização no onshore?

    Antes da transição energética vem a própria eficiência da emissão de carbono dentro da própria produção de petróleo. O que as empresas estarão buscando é, de fato, eficiência. O ESG está aí para isso, está se falando muito nesse assunto. Existem empresas que são listadas em bolsa com um carimbo. Existe uma sistemática por trás do ESG que condiciona a redução da queima. A transição energética é necessária, vai acontecer, não há o que discutir. Hoje, ela vem tanto de uma estrutura realmente voltada para a Europa, onde a matriz energética é bem diferente da nossa. O Brasil, de fato, está à frente em relação à utilização de fontes renováveis, estamos em uma posição um pouco mais
    confortável que outros países, e aí a demanda desses governos por melhora recai diretamente sob as principais empresas desses lugares, como ExxonMobil e Shell. Mas acho que vai chegar o momento que isso vai se espraiar para os menores também, mas acho que antes disso temos a nossa forma de melhorar mesmo estando em uma indústria de petróleo.

    Por Claudia Siqueira

    Fonte: PetróleoHoje